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Home/Guarda/Cabreira/Maria José Dinis, a mãe
Maria José Dinis, fundadora da ASTA - a Associação Sócio Terapêutica de Almeida

Maria José Dinis, a mãe

Natural da Cabreira, concelho de Almeida, Maria José aprendeu a ser pedagoga e socioterapeuta por causa do Marco, um filho que nasceu com deficiência. Maria José apresenta-se como mãe de Marco e é, também, mãe da ASTA, a associação sócio terapêutica com 44 companheiros e 42 colaboradores que ajudam a povoar e a dar sentido a esta pequena aldeia do Interior. Uma aldeia que tem magia. Eis o seu testemunho.

Pôr-do-sol na Cabreira
As cores quentes do entardecer na aldeia da Cabreira ©Tiago Cerveira

“Sonhei um espaço onde as pessoas pudessem ser inteiras”

Chamo-me Maria José Dinis, e sou uma mulher de 69 anos que nasceu aqui nesta aldeia da Cabreira. Uma aldeia atrás do sol posto, como dizem muitos, no interior Beirão. E que aqui fez nascer a ASTA, a Associação Sócio Terapêutica de Almeida. Podemos dizer, de alguma forma, que a ASTA é uma filha de Maria José. É um sonho realizado.

A ASTA é uma comunidade terapêutica onde pessoas com deficiência mental, com deficiência intelectual e multideficiência podem encontrar um caminho e um projeto de vida, um objetivo para a sua existência. 

Maria José Dinis, fundadora da ASTA - a Associação Sócio Terapêutica de Almeida
Maria José Dinis, fundadora da ASTA – a Associação Sócio Terapêutica de Almeida ©Tiago Cerveira

Tive a sorte de realizar esse sonho. Se a ASTA ainda não é uma comunidade terapêutica em toda a sua abrangência, estamos a trabalhar para que ela seja isso. E é isso neste lugar aqui dentro da natureza, dentro da ruralidade, da simplicidade, do ar ainda puro.

Esse sonho prende-se, com certeza, pelo facto de ter tido o Marco, o meu filho, que nasceu com paralisia cerebral. O Marco existe há 46 anos, o meu sonho deve ter começado a esboçar-se aí, mesmo que inconscientemente. Porque o facto de ter um filho com deficiência não me azedou a vida. Penso, até, que me estimulou para a vida, para a procura de quem é o ser humano, de quem somos nós. 

Marco, filho de Maria José
Marco, filho de Maria José ©Tiago Cerveira

Para procurar entender porque é que estas pessoas, chamadas de pessoas com deficiência, pessoas especiais, não teriam o cabimento normal na sociedade. O que havia a fazer por elas e para elas? E penso que o caminho foi mostrado exatamente pelo Marco. Portanto, sou sortuda nesse sentido. Sempre fui uma curiosa do ser humano, desde pequena, se bem me lembro. E o Marco veio dar-me respostas, veio apontar-me caminhos.

Vivia em Lisboa, trabalhava, uma vida normal. Mas deixei tudo, para procurar outro caminho. Procurei muito, experimentei, conheci. Fui dando vários passos, e, a pouco e pouco, fui encontrando respostas. 


O que eu gostava é que a Cabreira venha a ser mais ainda essa comunidade terapêutica com que sonhei. Mais consistente ainda, mais bonita ainda, com mais gente a viver aqui, a calcorrear estes caminhos e estas ruas.

Maria José Dinis

Mudei toda a minha vida. Qui aprender mais. Fui fazer um curso que me preparasse melhor para o futuro que eu procurava. Não basta ser sensível ao ser humano e ter boa vontade. Fui para a Suíça quatro anos, para tirar um curso de “Pedagogia Curativa” e Socioterapia. Regressei a Portugal e começou a expressar-se o sonho, trabalhando para isso. Até que no ano 2000 a ASTA foi criada. A ASTA nasceu aqui na Cabreira do Côa

Natureza em redor de Cabreira
“E porque não aqui?” ©Tiago Cerveira

Encontrei uma forma diferente de estar, um pouco inusitada na altura, quando decidi que seria aqui o espaço para a construção deste projeto. E as pessoas diziam mas porquê aqui, numa aldeia? Porquê aqui, num buraco? E porque não aqui?, perguntava eu. E porque só na cidade? 

Quis retornar às origens, depois de muitos caminhos caminhados, e perceber que a gente destas terras, e pessoas como o Marco, precisavam de respostas. Queriam, esperavam, procuravam. 

E também porque aqui tínhamos tudo o que era preciso para ter saúde, para gerar saúde, para promover o bem-estar. Os ruídos são diferentes, os desafios são diferentes e mesclam-se com a natureza, que é o mais fascinante aqui… esta natureza abundante, às vezes agreste com as grandes pedras, mas também com verde. 

Passeio matinal dos companheiros da ASTA
Passeio matinal dos companheiros da ASTA, em Cabreira ©Filipe Morato Gomes

A natureza foi e é uma ferramenta terapêutica, pedagógica, extraordinária, que dificilmente encontraremos numa cidade. Por exemplo, esta possibilidade de todas as manhãs começarmos o dia com uma caminhada a descobrir a natureza, a pisar no chão de terra, sentindo o vento na face, ou o sol, ouvindo a natureza, ouvindo os pássaros. Podemos imaginar como é que isso dispõe, predispõe, para o resto do dia? Essa caminhada é o nosso início de dia, todos os dias, desde a Covid.

Ainda antes dessa caminhada, fazemos uma abertura conjunta. Juntamo-nos e fazemos grupo. Aliás, somos grupo, nós sentimos grupo, nós ressentimos grupo. Recordamos, todos os dias, que estamos um por todos e todos por um, que temos um dia à nossa frente e que esperamos que seja cheio de alegria. Cantamos canções inerentes à época do ano que estamos a vivenciar, exercitamos alguns dos nossos sentidos para acordarmos da noite e depois vamos fazer a caminhada. Faça sol ou faça frio. E depois vamos para o nosso trabalho. Cada um no seu atelier ou oficina. Trabalhar. Exercer a cidadania.

Oficina de olaria

Oficina de olaria ©Filipe Morato Gomes

Zé Manel na carpintaria da ASTA

Zé Manel na carpintaria da ASTA ©Filipe Morato Gomes

Oficina de lã

Paulo fazendo bolas terapêuticas de lã ©Tiago Cerveira

Toda a gente tem capacidade para fazer coisas, seja quem for, seja o que for. Há sempre alguma coisa que sabemos fazer, nem que seja só com o olhar. Este sentido de fazer algo para os outros, de ser útil naquilo que faço. Todos podem ser útil naquilo que fazem, mesmo que demore três meses a fazer um banco na carpintaria, ou quatro, ou cinco, ou um ano. Mas aquele trabalho diário é extremamente importante, é uma responsabilidade, é o meu contributo. Eu estou a fazer algo que é útil, algo que é para os outros. Ou a olaria, ou a tecelagem, ou o ciclo da lã, ou a agricultura. 

É tudo isso que recriamos como espaço, como oficinas de trabalho. Cada um dá, oferece um pouco do seu saber, aprende a fazer. Esse é o pilar do trabalho.

Frase ASTA
A ASTA “é um núcleo de afetos” ©Filipe Morato Gomes

E depois, ao fim do dia, vamos para a nossa casa, cada um para o seu núcleo familiar. Há os que ficam na Casa da Fonte, os que têm maiores dependências, e há os que vão para as casas na aldeia. Cada um no seu respetivo núcleo familiar. Não é uma família biológica, mas é um núcleo de afetos, é um núcleo estruturado, como todas as famílias devem ser.

Somos um lugar onde há altos e baixos, onde há problemas, onde há dores, como toda a gente. E todos juntos, com a nossa forma de estar, com as nossas terapêuticas, com os nossos ritmos, tentamos aliviar, atenuar, apaziguar muitas dessas dores, tanto dos companheiros como nossas. É isso a socioterapia e a “pedagogia curativa”.

Não há utentes, nem clientes. Há companheiros, recordo. Companheiros porque vivemos com eles, lado a lado. Não para eles, mas com eles, aprendendo e ensinando ao mesmo tempo. E essa é outra riqueza.

Maria José no magusto da ASTA na aldeia da Cabreira

Maria José no magusto da ASTA na aldeia da Cabreira ©Filipe Morato Gomes

Maria José no magusto da ASTA na aldeia da Cabreira

Maria José no magusto da ASTA na aldeia da Cabreira ©Filipe Morato Gomes

O que nós quisemos fazer aqui na ASTA, admito, tendo em conta algumas respostas típicas existentes de cariz mais institucional, é diferenciador. Não temos aquela coisa clássica da instituição, que só por si é estigmatizadora. O que queremos é ter com estes companheiros uma vida normal. Por isso há casas e núcleos familiares nesta aldeia. O pilar da família é fundamental. Mesmo que não biológica, o que está em causa, são os afetos, a corresponsabilização conjunta, o podermos chegar do trabalho ao nosso espaço de descanso, ao nosso ninho, ao nosso colo.

E de manhã, todos juntos, preparamo-nos para mais um dia, para ir fazer a nossa tarefa, na olaria, na tecelagem, na lã, na agricultura. E depois, mesclamos todas essas tarefas com espaços mais terapêuticos, como a hipoterapia, a natação, a expressão corporal e artística, a música, a massagem, o yoga, dependendo das necessidades de cada um. 

Nuno na carpintaria

Nuno trabalhando na carpintaria da ASTA ©Filipe Morato Gomes

Luís a mexer no barro

Luís a mexer no barro na oficina de olaria ©Filipe Morato Gomes

Tapeçaria

Tapeçaria à venda na Trocas, a loja da ASTA ©Filipe Morato Gomes

E quais são as minhas alegrias? Estamos a fazer 25 anos. E na verdade, nos últimos anos, as minhas alegrias têm quase todas a ver com questões da ASTA. Claro que tenho pequenas alegrias pessoais. Mas a maior alegria é quando sinto nos companheiros (ou em alguns companheiros, porque não é em todos, nem é todos os dias) uma nova descoberta. Quando eles fizeram ou descobriram coisas novas passados anos, anos de tentativas. E então, sim, é uma coisa que sabe bem dizer: valeu a pena, vale a pena. Que alegria!

Eles são contagiantes. E depois, quando estamos com esta alegria, é mais fácil acolher, gerar outras alegrias.

Casa Maria José. na aldeia da Cabreira
Casa Maria José. na aldeia da Cabreira ©Tiago Cerveira

Ultimamente tenho tentado recordar-me dos momentos da minha infância aqui nesta aldeia. Talvez seja característica desta idade, começamos a relembrar-nos de algumas coisas que tínhamos esquecido, ou que estavam escondidas, arquivadas. E eu lembro-me, de mim pequenina, por aí, a descobrir a natureza, a escutar os pássaros e os grilos, a dar a mão ao meu pai que me levava com ele, quando vínhamos de levar os animais ao lameiro e de ser quase noite. E depois, de ele me dizer, a tomar-me pela mão, que estavam a tocar às trindades. E começava a rezar Ave Maria, gratia plena, Dominus tecum…. E eu com cinco ou seis anos a responder, Sancta Maria, Mater Dei…

É verdade, aprendi assim a rezar em latim. E eu lembro-me disso agora como se fossem momentos de magia. E quando eu olhava pelos buracos das paredes de pedra do caminho, ao pôr-do-sol, e via a ladeira lá ao longe, naquela luz… era algo de mágico.

Maria José Dinis, fundadora da ASTA - a Associação Sócio Terapêutica de Almeida

Maria José Dinis na aldeia de Cabreira ©Tiago Cerveira

Pôr-do-sol na aldeia da Cabreira

Pôr-do-sol na aldeia da Cabreira ©Tiago Cerveira

Maria José Dinis na aldeia de Cabreira

Maria José Dinis na aldeia de Cabreira ©Tiago Cerveira

A determinada altura saí daqui, como todos os jovens, aos 18 anos, para percorrer caminho, para saber mais, conhecer mais. Depois, quis voltar a esta aldeia que, de alguma forma, me deu chão e me deu um fio condutor.

Comecei a perceber que, afinal, o que eu gostava mesmo era de sentir a vida. E quando decidi que era aqui que eu queria voltar e que era aqui que queria ficar, percebi que esta aldeia tinha magia, essa tal magia que eu encontrei quando era pequena. E que essa magia ia permitir-me, contra tudo e todos, criar este espaço, este projeto que, no fundo, sonhava desde muito cedo. Um espaço onde as pessoas fossem mais felizes. Onde estivessem bem. Onde pudessem ser, inteiras. 

Maria José Dinis, fundadora da ASTA - a Associação Sócio Terapêutica de Almeida
Maria José Dinis, fundadora da ASTA – a Associação Sócio Terapêutica de Almeida ©Filipe Morato Gomes

Achei que a Cabreira tinha essa magia. E tem, lá no alto da Fonte Salgueira, sente-se um magnetismo na terra. Chamem-me demagoga, mas cada um tem as suas demagogias. E foi por isso que eu criei esta ASTA aqui na Cabreira, em boa hora.

Eu não sabia racionalmente muito bem porquê, talvez nem saiba muito racionalmente, mas como estou a dizer, com esta emoção que acabei de dizer, senti isso na Cabreira. Senti, sinto, continuo a sentir apesar das grandes dificuldades, porque houve dificuldades a vários níveis. A aceitação do diferente não é fácil. Foi preciso trabalhar isso, continuamos a trabalhar isso. Mas as pessoas da Cabreira também já são diferentes. E são diferentes por causa da malta da ASTA. 

Letreiro à estrada da ASTA, em Cabreira
Letreiro à estrada da ASTA, em Cabreira ©Tiago Cerveira

O que eu gostava? É que a Cabreira venha a ser, mais ainda, essa comunidade terapêutica com que sonhei. Mais consistente ainda, mais bonita ainda, com mais gente a viver aqui, a calcorrear estes caminhos e estas ruas. A dizer olá a toda a gente, a dar abraços, sem medo. A fazer coisas, sem medo. A plantar a terra. A pôr flores nas janelas.

Já começámos. Já começámos há muito tempo. O que é que queremos? Continuar a fazer isso.

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Letreiro à estrada da ASTA, em Cabreira

Cabreira do Côa, a aldeia dos companheiros

Conta-se que, desde há muito tempo, num pequeno vale abrigado por grandes pedras arredondadas, na raia com Espanha e a oeste de um rio que corre para norte e se chama Côa, vivia uma pequena comunidade de gente corajosa, simples e afável. Desde há 25 anos que a aldeia da Cabreira, no concelho de Almeida é também a morada da ASTA, uma associação sócio terapêutica dedicada à deficiência mental, que não tem utentes nem clientes. Tem companheiros e é um caso sério de compromisso com a integração social.

Ler Artigo Cabreira do Côa, a aldeia dos companheiros

Contigo, Há Descoberta

“Contigo, há Descoberta”, um programa de turismo inclusivo

Iniciativa de turismo social, inclusivo e de natureza é dinamizada pela ASTA – Associação Sócio Terapêutica de Almeida, e tem uma oferta estruturada de um, dois dias ou uma semana direcionada para adultos e crianças, empresas e famílias, todos os que procurem uma experiência turística humanizada e humanizadora.

Ler Artigo “Contigo, há Descoberta”, um programa de turismo inclusivo

Anémone Leton

Anémone Leton, a viajante que encontrou a paz

Nasceu na Bélgica, viajou pelo mundo, é profissional de turismo. Aos 34 anos diz ter a sorte, e o privilégio, de ter encontrado no projeto da ASTA um sentido para a vida e um espaço onde quer montar um ninho familiar, e continuar a aprender. É coordenadora do projeto “Contigo, há Descoberta!”, uma iniciativa de turismo social, inclusivo e de natureza. Agora só está preocupada em continuar a aprender, vai tirar o curso de Socioterapia e Pedagogia Curativa para poder partilhar com os companheiros muitas descobertas.

Ler Artigo Anémone Leton, a viajante que encontrou a paz

Guilherme

Guilherme Anjos, o guia turístico

Nasceu numa aldeia de Figueira de Castelo Rodrigo, mas passou a infância e a juventude numa casa de acolhimento para jovens em risco, perto do Porto. Antes de chegar aos 18 anos, foi ele quem pesquisou na Net e procurou o seu destino. Encontrou a ASTA e desde há três anos é um dos companheiros que vive na Casa da Oliveira, bem no centro da pequena aldeia de Cabreira do Côa. É, entre muitas outras coisas, um apaixonado guia turístico.

Ler Artigo Guilherme Anjos, o guia turístico

Luís Fonseca

Luís Fonseca, o braço direito

Foi quando uma amiga de infância lhe pediu contactos que ele entregou toda a sua ajuda. Ajudou-a a montar a associação, e desempenhou nela muitos papéis. Foi voluntário, depois funcionário, foi pai de casa e agora é responsável pela parte agrícola do projeto ASTA. É presidente da Junta.

Ler Artigo Luís Fonseca, o braço direito

Milene Sieiro

Milene Sieiro, a miúda forte e valente

Tem energia inesgotável, um eterno ar de menina traquina, um sorriso contagiante. Milene Sieiro tem 30 anos mas sente-se com 19. Não é residente da aldeia, mas é uma das companheiras que vem para a ASTA todos dos dias, há já 9 anos. É, também, uma das guias turísticas habilitadas para acompanhar visitantes no programa “Contigo, há Descoberta”.

Ler Artigo Milene Sieiro, a miúda forte e valente

Joaquim Caramelo, Cabreira

Joaquim Caramelo, o vizinho da Cabreira

Nos 87 anos que leva de vida, Joaquim Caramelo só conseguiu viver 9 anos fora da Cabreira, emigrado em França. Não gostou muito de lá estar. Mas ainda gosta de morar na aldeia que o viu nascer. Teve 15 irmãos, casou com uma vizinha da aldeia, tem dois filhos e uma boa dose de humor. É um contador de histórias, que mete conversa com todos os que passam na rua.

Ler Artigo Joaquim Caramelo, o vizinho da Cabreira


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Por Luísa Pinto 28/01/2025
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